A Verdade Entre a Dúvida e a Certeza: Uma Retomada

Em decorrência de alguns comentários que foram feitos ao artigo “A Verdade Entre a Dúvida e a Certeza”, que escrevi e publiquei em meu blog Liberal Space em 18 de Novembro de 2009 e que transcrevi, agora, no meu novo blog Karl Popper, resolvi retomar a questão numa abordagem que considero popperiana, mas usando as minhas palavras e meus exemplos. Vou ser até exageradamente simples e didático, como se estivesse conversando com meus alunos de Introduction to Logic em Hayward, em 1972, na primeira disciplina que lecionei no nível universitário.  Como a gente corre o risco de ser mal entendido e criticado quando tenta simplificar o que, em sua natureza, é complexo, peço desde já desculpas se algo que eu disser não for totalmente kosher do ponto de vista da Filosofia, da Lógica e da Linguística acadêmicas.

1. Introdução: A Linguagem e a Lógica

Todos nós falamos (pelo menos) uma linguagem natural. Linguagens naturais usam palavras e termos para construir frases e orações. A Lógica (sem qualificativos, no momento) espelha mais ou menos as linguagens naturais. Só que seus elementos são conceitos, qualificativos e conectivos, que, combinados, formam proposições ou enunciados. Há muitos tipos de frases nas linguagens naturais: descritivas, tautológicas ou contraditórias, normativas ou prescritivas, ordenativas ou comandativas, expressivas ou emotivas, executivas ou performativas. Exemplos:

  • Frases descritivas: “Há um gato em cima do telhado”, “Todo evento tem uma causa”
  • Frases tautológicas / contraditórias: “Todo efeito tem uma causa”, “Ali está um solteirão bem casado!”
  • Frases normativas / prescritivas: “O político corrupto deveria ser condenado à morte”, “Ninguém deve jamais agir contra sua consciência”
  • Frases ordenativas / comandativas: “Abra a porta para mim, por favor”, “Nunca deixe a luz de um cômodo acesa quando sair dele”
  • Frases expressivas / emotivas: “Ei, legal!”, “Ah, que pena!”
  • Frases executivas / performativas: “Eu lhe prometo nunca mais fazer isso”, “Eu, pela autoridade a mim deferida, os declaro casados, segundo as leis do Estado de Nevada”

De todos esses tipos de frases, a Lógica se ocupa mesmo dos três primeiros, que ela chama de proposições ou enunciados. Poderíamos chama-los, para distinguir dos tipos correspondentes de frases (entidades linguísticas), de:

  • Enunciados Empíricos (a posteriori, particulares ou gerais)
  • Enunciados Analíticos (a priori, tautologias ou contradições)
  • Enunciados Normativos (incluem pelo menos um termo valorativo, em um sentido positivo ou negativo: aprovação ou crítica)

A razão pela qual a Lógica não se interessa pelas demais frases ou orações está no fato de que não faz sentido considera-las verdadeiras ou falsas. Se eu lhe dou uma ordem do tipo “Feche a porta da geladeira”, não faz sentido você me disser: “Falso!”, ainda que você discorde de que deva fechar a porta da geladeira (porque você a está usando) ou mesmo que a porta da geladeira não esteja aberta para poder ser fechada. Da mesma forma nos dois últimos tipos de frases ou orações (mutatis mutandis).

Em relação aos três primeiros tipos de frases ou orações é sempre possível considera-las verdadeiras ou falsas – razão pela qual a Lógica criou estruturas paralelas para eles, que denomina de enunciados ou proposições.

No caso dos Enunciados Empíricos, que podem ser particulares ou gerais (o caso limite dos enunciados gerais sendo os enunciados universais, que se aplicam a todas as instâncias de uma categoria), sua verdade ou falsidade é determinada principalmente (talvez exclusivamente) pela experiência sensorial que faz uso da observação. Ou seja, para decidir se são verdadeiros ou falsos precisamos, primeiro, olhar, escutar, sentir, cheirar, provar… Em outras palavras: a decisão acerca de sua verdade ou falsidade se dá a posteriori da experiência, isto é, depois de observarmos a realidade.

No caso dos Enunciados Analíticos, que podem ser tautológicos ou contraditórios, não é preciso recorrer à experiência ou à observação para determinar sua verdade ou falsidade: basta considerar o significado dos termos envolvidos. É óbvio que todo efeito tem uma causa, porque o sentido dos principais termos utilizados implica isso: nada seria chamado de um efeito se não tivesse uma causa, nem de uma causa, se não tivesse o efeito. Estamos lidando aqui com uma tautologia: estamos dizendo a mesma coisa duas vezes. Se chamamos algo de um efeito ou de uma causa, já estamos dizendo que ele tem uma causa (no primeiro caso) ou um efeito (no segundo caso). Contradições são talvez até mais evidentes. Ninguém corretamente descrito como um solteirão pode ser casado – quanto mais bem casado! A razão é simples: o significado dos dois termos principais coloca os dois conceitos em compartimentos (classes) que não se sobrepõem ou que se excluem mutuamente.

No caso dos Enunciados Normativos a situação é mais complicada —  ou parece sê-lo. A maioria dos seres comuns (quero dizer: não filósofos) tendo a crer que nós, os humanos, sabemos, de uma forma ou outra, o que é moralmente certo e errado. Ser corrupto e roubar é moralmente errado. Ser honesto é moralmente certo. Mentir é moralmente errado. Dizer a verdade é moralmente certo. Cumprir promessas feitas é moralmente certo. Deixar de cumprir uma promessa feita é moralmente errado. E assim por diante. Todos esses exemplos tratam de categorias de ações ou conduta – por isso os Enunciados Normativos são todos gerais ou universais, neste caso. Mas há casos particulares de Enunciados Normativos: Fulano de Tal deve ir para a cadeia, porque foi comprovado que ele é corrupto e ladrão.

A dificuldade, nestes casos, está em como determinar que uma categoria de ações ou um conjunto de condutas é certo ou errado. Isso nada tem que ver com a lei do país ou da região. O Direito é uma coisa, a Moralidade é outra. Há condutas imorais que não são proibidas por nenhuma lei da mesma forma que há condutas altamente morais que não são tornadas obrigatórias por nenhuma lei. Mas, se não é a lei positiva do país ou região que decide essas questões, como são elas decididas? Temos nós, na área moral, um conjunto de mecanismos, equivalentes à percepção, na área empírica, que nos dão acesso privilegiado ao que é certo e errado? Nossa consciência? Nossa razão prática? Nosso senso moral ou de justiça ou de fair play?  (Propostas desse tipo são em geral chamadas de deontológicas pelos filósofos). Ou será que devemos determinar se um tipo de conduta é certo ou errado pelas suas consequências. (Propostas desse tipo são em geral chamadas de consequencialistas ou utilitaristas pelos filósofos). E o debate entre essas duas escolas está longe de ser resolvido. Felizmente, não precisamos tentar resolvê-lo aqui. Basta reconhecer sua existência.

2. Popper, a Filosofia, a Lógica e a Ciência

Popper é geralmente considerado o último grande generalista competente a surgir entre os intelectuais do século 20. Ele escreveu com razoável maestria e competência nas áreas de Filosofia, Lógica, Linguística, Psicologia, Pedagogia, Política, Física, Matemática, Estatística, Biologia (Evolução, Cérebro, etc.), Música (Harmonia), História Intelectual, etc. E era ainda bem entendido em Marcenaria. Basta ler sua Autobiografia (mesmo dando os descontos necessários: fontes externas comprovam, entretanto, a maioria das coisas que ele diz sobre si próprio, como algumas Biografias confiáveis atestam). Não vou dar os títulos para não atravancar o texto.

No entanto, Popper é, primeiro e acima de tudo, um filósofo, especializado principalmente em Epistemologia (Teoria do Conhecimento) e Filosofia da Ciência, e um lógico. E suas competências e habilidades lógico-filosóficas são aplicadas ao estudo da Ciência – especialmente a Ciência Experimental, com foco nas Ciências da Natureza, e, dentro destas, primeiro na Física e, mais tarde, na Biologia. Apesar de ele ter se envolvido ativamente em discussões importantes da Física e da Biologia, não é totalmente apropriado descrever Popper como um cientista. Nem um matemático, embora tenha escrito bastante sobre o Cálculo de Probabilidade, Estatística, etc.

Como o foco de Popper, na Filosofia, está na Epistemologia e na Filosofia da Ciência (em especial a Física), e a Lógica se encaixa perfeitamente nos temos aqui envolvidos, poderíamos dizer que Popper é um filósofo que estuda a lógica da ciência física do ponto de vista da definição, da demarcação, da atestação e do desenvolvimento do conhecimento científico.

Por isso, apesar de suas importantes considerações relativas à Matemática, à Ética, e à Política, não vou considerar no que segue sua contribuição à elucidação dos Enunciados Analíticos e dos Enunciados Normativos. Vou me ater à sua discussão dos Enunciados Empíricos, tanto os da Ciência Empírica (em especial a Física) como os do chamado Senso Comum. Lembro-me de haver lido em algum lugar, há muito tempo, que, para Popper, havia uma continuidade entre o Senso Comum e a Ciência Empírica, esta nada mais sendo do que um Senso Comum Metódico e Rigoroso. Algo assim. Discutir o Senso Comum ao lado da Ciência Empírica, se isso é verdade, faz muito sentido.

Além disso, os enunciados particulares que refutam os enunciados gerais da Ciência Empírica são, em geral, compartilhados com o Senso Comum. Um enunciado geral (universal) positivo do tipo “Todos os x são y” ou “Todo x é y” (que é equivalente ao anterior) implica a negação de um enunciado geral (universal) negativo “Nenhum x é não-y”. Assim, se você identifica (observa) um x que é não-y (“Este x é não-y”), você falsifica os dois enunciados gerais (universais), o positivo e o negativo.

3. Alguns Conceitos Básicos

Nossa discussão vai envolver o uso de alguns conceitos básicos. Em alguns casos esses conceitos vêm em pares de opostos, mais ou menos simétricos – mas nem sempre, como no caso do último par, Ceticismo e Relativismo:

  • Conhecimento e (Mera) Crença
  • Razão e Fé (Revelação)
  • Evidência e Inevidência
  • Verdade e Falsidade
  • Verificação e Falsificação
  • Objetividade e Subjetividade
  • Certeza e Dúvida
  • Ceticismo e Relativismo

 Meus três filósofos favoritos (além de Sócrates, que é hors concours), David Hume, Karl Popper e Ayn Rand, dizem coisas interessantes mas incompatíveis sobre esse conjunto de conceitos e eu admiro muito as ideias dos três. Por isso, como disse no artigo anterior, fico meio dividido em meio às ideias deles.

4. Meus Filósofos Favoritos

  • David Hume (1711-1776) era um Cético – embora ele se considerasse um Cético Mitigado, não um Cético Radical que duvidava de tudo.
  • Karl Popper (1902-1994) era um Racionalista – Racionalista Crítico, ele diria.
  • Ayn Rand (1905-1984) era uma Racionalista – mas preferia se descrever como Objetivista.

Neste seção deste artigo vou repetir algumas coisas que já disse no artigo anterior.

O que aprecio sobremaneira em Hume é seu ceticismo sensato, sua capacidade de duvidar quando era preciso duvidar e não duvidar quando era sensato não fazê-lo. Hume era mais historiador do que cientista, ele lidava mais com evidência que aparecia na forma de testemunhos não muito confiáveis do que de artefatos que é difícil negar.

Um morto pode ressuscitar depois de estar morto por três dias? Hummm, diria Hume. Pode ser que sim. Não digo que é impossível. Mas se alguém me disser que isso aconteceu no passado, ou que viu isso acontecer no presente, eu não vou acreditar. No caso passado, não é possível que eu volte até lá para investigar o caso por mim mesmo. No caso presente, eu vou querer examinar o caso por mim mesmo. Mas mesmo assim, acho muito difícil que eu possa acreditar mais nos testemunhos de terceiros (que erram, porque seus órgãos dos sentidos os enganam, ou são deliberadamente enganados por gente de má fé) no que na minha experiência uniforme até hoje de que quem morre, e fica morto por três dias, continua morto…

Hume conta a história de um chefe de tribo africano que estava sentado ao lado de um enorme lago na África Central, vendo enormes elefantes beber água no lago. Um estrangeiro chegou até ele e lhe disse mais ou menos isso (cito de memória): “Na minha terra a água em algumas épocas do ano fica tão dura que vários elefantes poderiam atravessar um lago desse tamanho a pé”. O africano contestou: “Não acredito”. E estava certo em não acreditar, diz Hume, porque o que lhe dizia o estranho viajor contrariava tudo que ele havia até ali visto – tendo ele também tido experiência de que estrangeiros, como pescadores, gostam de contar mentiras e de exagerar as coisas… Mas, acrescenta Hume, apesar de o africano estar certo em acreditar, porque, dada a evidência que ele possuía, era-lhe racional assim crer, nós, de um ângulo mais aberto, sabemos que ele, na realidade, estava errado e que o viajante estrangeiro dizia a verdade…

Hume era assim. Cético, mas sensato. Cético, mas mitigado, pois algumas coisas, em geral particulares, mas não só, ela sabia que eram verdadeiras…

O que sobremaneira me interessa nas ideias de Popper é o seu falibilismo epistemológico. Exceto na Lógica (incluindo a Matemática), onde a verdade é plenamente encontrável porque, na realidade, a lógica define as regras do jogo racional, as regras que os nossos julgamentos, os nossos pontos de vista, as nossas hipóteses, teorias, etc. devem seguir, segundo ele, para poder ser sempre falsificadas ou refutadas pela realidade. Se nossos julgamentos, etc. não forem falsificáveis ou refutáveis pela realidade, não dirão nada, não proibirão nenhum estado de coisas, serão vazios de conteúdo, totalmente vácuos – isto é, serão totalmente fajutos, por assim dizer. Em outras palavras: a infalsificabilidade ou irrefutabilidade de nossos julgamentos, etc., longe de ser um mérito deles, é, para eles, um defeito epistemológico insanável – um pecado mortal no plano da epistemologia.

Essa tese me fascina – porque ela me permite voltar a fazer contato com as ideias de Hume. As ideias de Hume eram céticas – e ele, como pessoa, se comportava com a humildade intelectual que um cético deve ter (afinal, ele afirma não saber nada, ou quase nada – vai se orgulhar de quê?). Popper afirma que o cientista é um buscador da verdade, não o seu orgulhoso possuidor. Como buscador da verdade, a humildade intelectual cai bem ao cientista.

Popper chegou a afirmar, peremptoriamente, que a verdade existe e que é possível encontrá-la – mas em seguida qualificou sua afirmação dizendo que, no entanto, nunca teremos razão bastante para afirmar que a encontramos…

Ayn Rand era qualquer coisa menos humilde, como pessoa e como intelectual. Como Popper, suas ideias também apontam para a postura de quem busca a verdade. Mas diferentemente de Popper, ela acreditava (do ponto de vista epistemológico) ser perfeitamente possível encontrar ou alcançar a verdade. Na realidade, ela não tinha a menor dúvida de que ela a havia encontrado… Sua busca da verdade, portanto, não era humilde… não era uma busca de quem sabe que não vai encontra-la (como Hume), nem mesmo uma busca de quem temia que, se a encontrasse, não iria reconhecê-la como tal (como Popper). Epistemologicamente, ela era mais otimista do que Popper – e infinitamente mais otimista do que Hume…

Ou seja, em Ayn Rand temos, na pessoa, o orgulho de quem encontrou a verdade – e, portanto, não precisa mais busca-la. Na obra de Ayn Rand ela procura nos mostrar por que estaria justificada em afirmar que havia encontrado a verdade. Tendo a concordar que ela está certa em tanta coisa, mas…

Com Popper e com Rand, e contra Hume, estou convicto de que a verdade existe e de que é possível aceder a ela. Mas, como disse, fico meio dividido entre, de um lado, a tese popperiana de que, mesmo que a verdade exista e seja encontrável, nunca poderemos ter certeza de tê-la encontrado, e, de outro lado, a tese randiana de que a verdade existe, é encontrável, e é possível ter certeza de que a encontramos (embora a justificativa dessa certeza seja extremamente complexa do ponto de visto filosófico).

Fico dividido, humeanamente, no meio: humildemente buscando a verdade, ao mesmo tempo duvidando, intelectualmente, de todas as verdades, mas com uma tendência forte a acreditar que algumas aspirantes à verdade estão bem mais próximas dela do que outras… A questão que não consegui resolver ainda é se essa tendência é, como afirmava Hume, simplesmente uma característica não-racional de minha natureza humana, ou se ela é racional, como pretende Rand – pelo menos em parte….

Talvez seja por isso que, mesmo quando julgo ter encontrado a verdade, procuro não ser arrogante – porque, quem sabe, eu estou errado e aquela besta arrogante ali do lado pode estar certa.

5. Algumas Questões Levantadas

Alexandre M G Moreira me contestou em um post do Facebook dizendo:

“Eduardo, sinto-me em uma situação bem semelhante…

A frase do Gide parece-me acurada, não consigo pensar em uma postura racional que não admita a possibilidade esmagadora do erro, sempre…

A razão humana, como eu a vejo, ‘exige’, para se aproximar de sua ‘plenitude’, da ubiquidade da dúvida.

Mas, para mim, essa postura epistemológica leva a uma posição ética próxima a uma certeza quase apodítica. Nesse ponto estou quase sempre em concordância com Ayn Rand (embora não acredite em sua própria teoria ética), e contra a posição claudicante do Popper.”

Em outro post ele acrescentou:

“Procurando as palavras para dizer o mesmo de outra forma:

O reconhecimento da falibilidade da razão, não importando em que contexto (mesmo na lógica) é o inicio dela mesma, sua semente para onde sempre se volta.

Sempre tive um grande problema com os conceitos, definições…

Um dos motivos, entre muitos outros, é o pensamento linear polarizado. Explico: a nossa tendência, necessária acredito, de nos limitar em algum momento do discurso no: “é isso ou não-isso”, e que por um salto, magicamente, nos leva ao: “é isso ou aquilo” , que nos ilude com uma frequência nauseante. É quase sempre falso. Eu diria que é a lógica que ficou bêbada e perdeu o rumo.

Não sei se piorei ainda mais o entendimento do que queria dizer, mas aí estão meus dois centavos de pensamento!…”

Vou argumentar concordando com que o Alexandre afirma, porque essa questão me perturba também. Como ele, não tenho dúvida de que nosso conhecimento empírico (derivado da percepção, através dos órgãos sensoriais), é falível e, portanto, dubitável, não admitindo certeza. Em relação a ele devemos ter sempre uma razoável dose de ceticismo. Não adiante, portanto, citar a ciência ou os cientista, dizendo “Science says…“, como Billy Graham dizia “The Bible says…

No caso do chamado conhecimento formal (lógica e matemática, ou as lógicas e as matemáticas) hesito em considera-lo falível porque me inclino a considera-lo — como direi — convencional? Definimos os termos e as relações sintáticas entre eles de modo que eles se tornam não só verdadeiros ou falsos, mas necessariamente verdadeiros ou falsos. Concordo com Popper que o Convencionalismo de Henri Poincaré (1854-1912) e de Pierre Duhem (1861-1916) é rejeitável — mas apenas na Ciência Empírica (e, talvez, na área normativa da Ética e da Política, não na Lógica e na Matemática.

O Convencionalismo que admite falar em verdade na área das Ciências Formais é mais “escancarado” na Lógica Formal e na Matemática Abstrata (dita Pura), que mal se distingue da Lógica Formal, mas também me parece ser o caso na Matemática Aplicada e, até certo ponto, na Linguagem do Senso Comum (aquela que os filósofos analíticos inspirados pelo Wittgenstein mais velho (das Philosophical Investigations) chamam de Common Sense Language.

Hume disse, no Tratado, como já mencionei, que “todo evento tem uma causa” é um enunciado empírico, e, portanto, falível, mas que “todo efeito tem uma causa” não é falível, porque, sendo um enunciado lógico ou analítico que é verdadeiro necessariamente (a priori, sem necessidade do concurso da experiência), não nos cabe duvidar dele…

No caso dos, digamos, enunciados normativos, se é que podemos chama-los assim sem impropriedade, a coisa fica mais complicada, porque valores entram em cena e nos levam a concluir que algo é bom ou certa conduta certa, com base em princípios que incluem pelo menos um elemento normativo ou valorativo. Eles podem ser verdadeiros ou falsos? Em caso positivo, como determinamos isso?

Mas vamos em frente, continuando a discussão…

Em Salto, 4 de Março de 2018

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